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quarta-feira, 28 de julho de 2010

Talento é nato? by Frederico Porto

Quando se fala em talento, logo pensamos em Mozart, Machado de Assis,

Pelé ou Ayrton Senna. Ao mesmo tempo, pensamos que estas pessoas

conseguiram ser extraordinárias em suas atividades sem esforço.

Será que isso é verdade?

Não! Não é verdade. Os estudos atuais cada vez mais demonstram que a

excelência em uma determinada área é fruto de muito esforço. Até mesmo

para os “gênios”. Além disso, não se trata apenas de uma questão de

esforço, pura e simplesmente, mas de esforçar-se de maneira correta.

Esforçar-se da maneira certa explica questões como o fato do recorde

da maratona dos Jogos Olímpicos de 1896 ser somente um minuto

mais rápido que o tempo necessário para classificar-se para a atual

Maratona de Boston., Ou, ainda, , que quando Tchaikovsky compôs

o seu concerto para violino e apresentou aos dois maiores

violinistas da época, estes afirmaram ser impossível tocar tal composição.

Sendo hojé é parte do repertório de qualquer violinista profissional.

O que acontece é que os indivíduos descobrem, após as superações,

maneiras de esforçar-se ainda mais ou métodos de treinamento,

que, levam a um novo nível de performance. Os estudos atuais

mostram que três fatores em conjunto são os responsáveis pelo talento:

1-Treinamento Profundo
2-Motivação
3-Mentores competentes

A crença de que o talento é algo nato aponta para a afirmativa

de que esses indivíduos atingiriam um nível excepcional de

performance rapidamente, logo que adquiram as habilidades e

conhecimentos básicos do domínio em questão. Ou seja, basta ensinar

para os Ronaldos da vida o básico do futebol que eles atingirão um nível espetacular.

Mas, para provar que esta teoria não é exatamente uma teoria acertiva,

posso citar os estudos com jogadores de xadrez; um jogo que permite

comparar jogadores atuais com outros já aposentados ou falecidos.

Ninguém atingiu um nível de mestre internacional de xadrez com menos de

dez anos de prática, mesmo gênios como Bobby Ficher ou Judith Polgar.

Esta regra dos dez anos é evidenciada em outros domínios, como na música,

matemática, tênis, natação e corrida de longa distância.

Logo, não seria diferente no mundo corporativo. Para que um executivo

chegue ao ápice de sua capacidade, são necessários, pelo menos, de

dez a 15 anos. Este tempo de cerca de uma década é o necessário para

praticar as famosas 10 mil horas que se afirma serem necessárias para que

um indivíduo transforme-se excelente no que desempenha.

Porém, para chegar a um nível excepcional de performance a prática deve

ser o que chamamos de treinamento profundo, que consiste em um aumento

na duração, intensidade e estrutura do treinamento. Fazendo uma analogia

com o esporte, trata-se do jogador que treina milhares de vezes a mesma

maneira de bater determinado tipo de falta, já que, se for depender de aprender

durante o jogo, ele irá bater esta falta pouquíssimas vezes. Neste ponto,

é importante salientar que, vai haver um momento da prática em que a pessoa

terá a sensação de que está pior que antes. O que não é verdade: a pessoa

estará mais consciente dos próprios erros.

Mas, como de fato podemos transpor isto para o mundo corporativo?

Quanto ao treinamento, primeiro é necessário entender que, escolhendo

focar nas forças ou nas fraquezas, de qualquer forma, será necessário

de praticar muito. O indivíduo deve procurar criar situações onde exercite

o que quer aprimorar. Winston Churchill treinava seus discursos na frente

do espelho. Procure observar pessoas que tem a habilidade que você

quer desenvolver. Todo processo de aprendizagem tem de ter feedback,

portanto, peça o feedback de outras pessoas sobre a sua evolução,

faça um diário onde possa anotar o seu dia, de forma que,

de tempos em tempos, reveja o seu desenvolvimento.

Lembre-se não é qualquer prática que leva à excelência.

Um aluno perguntou ao seu professor de violino quanto tempo ele tinha

de praticar para tornar-se um grande músico., Ao que o professor respondeu:

“ Realmente não importa quanto tempo. Se praticar com seus dedos,

nenhuma quantidade é a que chega. Se praticar com sua cabeça, duas horas são suficiente”.

Quanto à motivação, as pessoas talentosas têm uma insatisfação que as

impele a buscar a melhoria continua, e uma das maneiras de ativar

isto é entendendo que nós somos animais sociais, então um grande

motivador é querer fazer parte de um grupo especial. U um gestor dever

ser capaz de acender esta chama em sua equipe. Os membros da equipe

têm de querer se tornar um grupo talentoso e treinar para tal> neste ponto,

aqui entramos no terceiro fator responsável pelo talento, que são mentores competentes.

Um estudo com alguns mentores mostra que eles possuíam ao mesmo tempo

uma capacidade para acolher a pessoa, de entendê-las e pontuar, de maneira

objetiva, o que precisava ser melhorado, pois se não for objetivo, não há como

via a prática chegar a maestria.

Reflita sobre o que quer aprimorar, procure entender o máximo sobre o tema,

busque referências de indivíduos brilhantes na área, e, melhor ainda, de

pessoas que você conhece e que foram capazes de aprimorar o que você também

quer aprimorar. Comece, imitando, pois é assim que todos começaram,

e pratique, mas pratique muito. Eu sei que, como executivo, a sua vida é

mais dura do que de um atleta, pois enquanto 90% do tempo dele é

dedicado ao treinamento, você, ao contrário, passa 90% na vida real e,

quando muito, tem 10% para ser treinado. Diante desta situação,

que vai requerer muita disciplina, eu sempre me pergunto até que ponto

estamos usando o talento nato para justificar a nossa preguiça de nos desenvolvermos.

*Frederico Porto é psiquiatra, nutrólogo e professor convidado da Fundação Getúlio Vargas e Fundação Dom Cabral. Atua também como coach e consultor de empresas

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